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Agente Etiológico

    O Trypanosoma cruzi  é o protozoário causador da Doença de Chagas, também conhecida como Tripanossomíase Americana.

Epidemiologia

     A tripanossomíase americana está presente desde o sul dos Estados Unidos até o Chile, sendo endêmica no México e em todos os países da América Central e América do Sul. A Organização Mundial da Saúde estimou em 2016 um total de 6 a 8 milhões de pessoas infectadas, com cerca de 12.000 mortes anuais atribuídas à doença, principalmente em decorrência da  cardiopatia crônica. 

   No Brasil, os estados mais acometidos são o Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás.

    O protozoário já foi encontrado em mais  de 100  espécies de mamíferos, dentre eles  gambás, tatus, roedores, coiotes e guaxinins.  Pets (cães e gatos) também podem se tornar reservatórios da doença.

   A doença era tipicamente de zonas rurais, mas com o êxodo desses habitantes, passou a ser frequente em zonas urbanas. Formou-se um ciclo doméstico e peridoméstico independente do ciclo silvestre: o desmatamento e a mudança da biocenose fizeram com que o barbeiro buscasse o abrigo mais próximo, ou seja, casebres, galinheiros e chiqueiros. Algumas espécies de triatomíneos se adaptaram bem a esses ambientes, pela disponibilidade de alimento e a presença de moradores –  humanos, "pets", roedores... –  o que favoreceu o ciclo doméstico da infecção.

    Houve substancial redução das taxas de prevalência da infecção por T cruzi em faixas etárias mais jovens em vários países endêmicos, à medida que foram implementados testes obrigatórios de triagem para doação de sangue e campanhas de combate ao vetor domiciliar da doença.

 

Transmissão

     A infecção clássica ocorre pela penetração de tripomastigotas metacíclicos em locais vulneráveis do corpo (mucosas, conjuntivas, solução de continuidade na pele onde o inseto picou).  Tais formas são eliminadas nas fezes de triatomíneos durante o hematofagismo.

   Os vetores naturais do protozoário transmissor da doença são popularmente conhecidos como "barbeiros"; no Brasil. Eles consistem em insetos hemípteros da subfamília Triatominae, cujos principais gêneros são o Triatoma, Panstrongylus e Rhodnius.

      Outras formas de transmissão incluem:

  • Transfusão sanguínea; objetos com sangue contaminado (agulhas, seringas);

  • Transmissão transplacentária, quando existem ninhos de amastígotas na placenta, que liberam tripomastígotas que chegam à circulação fetal. Como a transmissão por vetores transfusão sanguínea foram reduzidas, a proporção de transmissão congênita   aumentou;

  • Acidentes de laboratório;

  • Transplante de órgãos;

  • Transmissão oral pela ingestão de tripomastigotas metacíclicos presentes em alimentos contaminados (quando o inseto é triturado junto com o alimento). Esta forma de transmissão teve grande destaque há poucos anos no Brasil, quando  múltiplos casos locais  relacionados à ingestão de açaí ou cana-de-açúcar  chamaram atenção de médicos e pesquisadores. 

 

 Micrografia de Trypanosoma cruzi em um esfregaço de sangue usando técnica de coloração com Giemsa.

   Posição Sistemática

Reino:   Protozoa

Filo:      Sarcomastigophora

Classe: Zoomastigophorea

Ordem: Kinetoplastida

Família: Trypanosomatidae

 

               Morfologia:

  Duas formas morfológicas do Trypanosoma cruzi são encontradas no interior de hospedeiros vertebrados:

 

a) Amastigotas: formas intracelulares que são encontradas nos tecidos do hospedeiro. Possuem uma organela chamada “cinetoplasto”, que constitui uma mitocôndria modificada, muito rica em DNA, localizada próxima ao núcleo.

b) Tripomastigotas: formas extracelulares, presentes na corrente sanguínea. O cinetoplasto se apresenta grande e redondo e o núcleo é central. Possuem também uma longa membrana, da qual se projeta um flagelo.

Nos insetos transmissores, além das formas amastigotas e tripomastigotas, são encontradas também as formas epimastigotas, que são a forma de reprodução no triatomíneo, e as tripomastigotas metacíclicas, que são a forma infectante.

 

 

 

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 Inseto triatomíneo (barbeiro), vetor do Trypanosoma cruzi .

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Quadro clínico

 Fase Aguda

    É frequentemente assintomática. Quando sintomática, as manifestações locais surgem de 4 a 10 dias após a picada do inseto, quando o Trypanosoma cruzi penetra na conjuntiva, causando o sinal de Romaña (edema bipalpebral unilateral e congestão da conjuntiva), ou na pele, causando chagoma de inoculação, uma lesão maculo-nodular eritematosa e pouco dolorosa. Estas lesões aparecem em 50% dos casos agudos, regredindo em um ou dois meses. Geralmente, os linfonodos próximos à lesão encontram-se palpáveis.

    Após estas possíveis manifestações da entrada do parasito, a fase aguda pode evoluir com febre, edema localizado e generalizado, linfadenomegalia, hepatomegalia, esplenomegalia e, às vezes, insuficiência cardíaca e perturbações neurológicas. Em pacientes imunossuprimidos, complicações como a insuficiência cardíaca e a meningoencefalite causadas pelo parasito podem levar a óbito ainda na fase aguda.

    Na sequência, o paciente entrará em uma fase  indeterminada que poderá durar muitas décadas.

      Destaca-se, porém, que seja pela natureza inespecífica dos sinais e sintomas, ou pela falta de acesso à saúde nas populações mais pobres,  o diagnóstico específico não ocorre na maioria dos casos da infecção aguda. 

 Fase Crônica Sintomática

     O acometimento gastrointestinal e cardíaco da infecção crônica por T. cruzi torna-se evidente muitos anos ou mesmo décadas após a infecção inicial, ocorrendo essencialmente em adultos. No entanto, o risco para o desenvolvimento de  manifestações clínicas em pessoas cronicamente infectadas é de apenas 10% a 30%.

                                                            Forma cardíaca:

     A manifestações mais comuns e graves da infecção crônica são cardíacas, em decorrência da presença do parasito no órgão.

     Pode ocorrer insuficiência cardíaca congestiva (ICC) devido à destruição do músculo cardíaco, que se encontra preenchido por ninhos de amastigotas e posterior substituição por tecido fibrótico.

      São também frequentes os fenômenos tromboembólicos, os quais  podem ser cardíacos ou provenientes dos membros inferiores. Formam-se trombos e/ou êmbolos que ocluem a circulação sanguínea em algum ponto e podem causar infartos do coração e de outros órgãos como pulmões e rins.

    Os pacientes com cardiopatia chagásica apresentam dispneia aos esforços, insônia, congestão visceral, edema em membros inferiores, fraqueza e sensação de palpitações.

 

Forma digestiva:

       As manifestações digestivas  resultam da denervação das vísceras ocas e a consequente disfunção de tais órgãos. É caracterizada principalmente pelo megaesôfago (dilatação do esôfago), cujos sintomas incluem: disfagia, odinofagia, dor retroestemal, regurgitação, pirose, soluço e tosse (muitas vezes denominada "mal do engasgo", pela facilidade com que o paciente sofre deste sintoma).

     Como a segunda manifestação digestiva mais frequente, tem-se o  megacólon (dilatação dos cólons sigmoide e reto). A associação entre ambas não é rara, o que agrava a desnutrição. Os principais sintomas são dor e constipação (esta, com o passar do tempo, torna-se muito severa, tendo o paciente dificuldades para defecar mesmo com o uso de laxantes). As complicações mais graves consistem em obstrução intestinal e a perfuração, que pode causar peritonite.

Diagnóstico

Diagnóstico clínico

     Avaliar a origem geográfica do paciente e se este viajou para zonas endêmicas;

Atentar à presença de sinais da fase aguda como o chagoma de inoculação e o sinal de Romaña, acompanhados de febre, linfadenomegalia periférica, hepatoesplenomegalia e outros sinais da fase aguda.

A suspeita de insuficiência cardíaca pode ser confirmada pelo eletrocardiograma e a suspeita de megaesôfago ou cólon pelo raio-X ou outros exames de imagem. No entanto, para confirmar que a origem desses problemas é a patologia chagásica, é preciso realizar testes laboratoriais.

 

Diagnóstico laboratorial

     Na fase aguda, recomenda-se geralmente a pesquisa direta do parasito, já que se observa altas taxas de tripomastigotas no sangue. Testes indiretos também podem ser utilizados porque há a formação de anticorpos inespecíficos e início da formação de anticorpos específicos (IgM e IgG). Os exames realizados podem ser:

  • Esfregaço de sangue periférico;

  • Cultura de sangue ou material de biópsia (linfonodos);

  • Métodos de concentração – método de Strout: consiste em deixar o sangue coagular e retirar os parasitos do coágulo a medida que ele se retrai, concentrando-os no soro, que pode ser centrifugado para exame;

  • Testes imunológicos como ELISA e RIFI, embora sejam melhores para a detecção na fase crônica.

 

   Na fase crônica, os métodos indiretos são mais utilizados porque a carga do parasito no sangue é menor. É recomendado que se use pelo menos 2 métodos com metodologias diferentes. Se um dos testes mostrar-se reagente e o outro não-reagir, é necessário repetir os testes, geralmente utilizando-se PCR. Os métodos da fase crônica podem ser:

  • Sorológicos, pela pesquisa de anticorpos específicos (ELISA, fixação do complemento, hemaglutinação indireta, IFI, etc).

  • Pesquisa direta do parasito: xenodiagnóstico e hemocultura. O xenodiagnóstico consiste em alimentar barbeiros normais em supótos portadores da infecção e determinar, depois, se eles adquirem ou não o parasitismo.

  • Moleculares: PCR, com pesquisa de DNA do parasito, sendo possível pesquisar o DNA do cinetoplasto.

 

     Profilaxia e Controle​

  • Melhoria das habitações rurais. Nas situações em que não for possível construir casa de alvenaria, aquelas que suportam uma reforma poderiam ser rebocadas e caiadas. A melhoria deve se estender ao peridomicílio: galinheiros, chiqueiros, etc.

  • Combate do barbeiro com o uso de inseticidas.

  • Controle de doadores de sangue.

  • Controle da transmissão congênita.

Tratamento

Só é possível na fase aguda da doença, pois as medicações só têm ação nas formas tripomastrigotas. Medicamentos como rochagan e benznidazol podem curar ou diminuir em 80% o risco de a doença evoluir para a fase crônica. Essas drogas também são indicadas quando há transmissão congênita.

Para as manifestações cardíacas e digestivas só é possível controlar os sintomas. Quando a fase crônica tem manifestações cardíacas brandas, o tratamento recomendado para a fase aguda pode impedir a progressão da doença. A prescrição do tratamento etiológico na fase crônica, entretanto, é controversa devido a dificuldades em monitorar sua eficiência terapêutica.

         Contato

Referências

Medscape - Chagas Disease

(https://emedicine.medscape.com/article/214581-overview  

                      Livros

Parasitologia Contemporânea 

Parasitologia: uma abordagem clínica

Parasitologia Humana, 12ªEd.

Tratado de Medicina Interna de Harrison, 19ª Ed.

Clínica Médica, HCUSP, 2º Ed.

Atualizado em 21/04/2018

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